Uma criança desaparecida, pais biológicos foragidos, tráfico internacional de drogas, um rapto violento e um roteiro de fuga engenhoso. Um sequestro de enredo rocambolesco começou a ser desvendado na segunda-feira 19, quando a Polícia Federal divulgou ter encontrado na Itália, com o apoio da Interpol, a menina Ida Verônica Feliz, 10 anos, que estava na lista de desaparecidos do órgão após ser raptada há quase dois anos de sua família adotiva no Brasil. O problema é que, apesar da divulgação, as autoridades brasileiras e italianas não sabem onde a garota se encontra, e é possível que ela tenha sido levada para a República Dominicana, onde as chances de recaptura são remotas, porque a criança e a sequestradora, sua mãe biológica, possuem nacionalidade no país. A ISTOÉ conseguiu, com exclusividade no Brasil, informações sobre os passos da criança após sua saída abrupta do País.
A história começa quando Ida tinha apenas 3 meses. Filha de um casal de traficantes de drogas, o italiano Paolo Ceccato (que no Brasil se apresentava com o falso nome de Pablo Milano Escarfulleri) e a dominicana Élida Isabel Feliz, era só um bebê quando sua mãe a deixava sozinha durante horas num quarto de hotel em Cuiabá (MT). Aos funcionários, a mulher afirmava que a menina “precisava aprender a se virar”. Diante da situação, a camareira Daniele Siqueira passou a cuidar de Ida. Aos poucos, Élida foi permitindo que a moça levasse a criança para a casa de sua mãe, Tarcila Gonçalina de Siqueira. Não demorou até que Ida passasse a morar em tempo integral com Tarcila. A mãe natural ainda a visitou algumas vezes, apesar de nunca ter demonstrado intenção de levá-la consigo. Quando a criança tinha cerca de 2 anos, a família adotiva conseguiu a guarda provisória. Ida sabia de sua verdadeira condição, mas chamava Tarcila de “vovó”. Tinha outras crianças como parentes, era uma excelente aluna na escola e fazia balé. Enquanto isso, seus verdadeiros pais foram presos por negociar entorpecentes. Ceccato foi expulso do Brasil em 2009, e em 2010, após sair da cadeia, Élida raptou o filho mais novo, Pietro, que estava em Tubarão (SC).
A mãe natural, que morava em Vicenza, na Itália, fugiu com Ida para a República Dominicana, sua terra natal, segundo o advogado do casal.
No dia 26 de abril de 2013, um veículo Celta branco estacionou à porta da família Siqueira. Em casa, estavam Ida, então com 8 anos, e Daniele. Os criminosos bateram à porta e anunciaram o sequestro. Ao avistarem a menina, disseram que era ela quem procuravam, arrastaram-na pelos cabelos e dispararam em alta velocidade. Daniele não reconheceu os bandidos, mas a principal hipótese do delegado Flávio Stringueta, do Grupo de Combate ao Crime Organizado de Cuiabá, é que eles tenham sido contratados pelo pais naturais. A garota entrou para a lista de raptados da Interpol e estava desaparecida até a semana passada, quando a organização descobriu sua localização na região de Vicenza, no norte da Itália. Mas até agora ninguém sabe dizer onde ou com quem ela está. No Brasil, a PF afirmou não ter a informação, e o Ministério das Relações Exteriores só entrará no caso se for necessária assistência consular. A Interpol disse que somente articula a conexão entre autoridades brasileiras e italianas. As polícias competentes na Itália também se mantêm em silêncio.
Segundo investigação do periódico italiano “Giornale di Vicenza”, Ceccato e Élida residiam numa casa alugada com três filhos. Os mais velhos são Ida e, provavelmente, Pietro. O terceiro nasceu depois dos raptos. A polícia local investigava o casal desde o ano passado e estudava a melhor forma de remover a garota, mas a mãe viajou com as crianças para Santo Domingo, na República Dominicana, pouco antes do Natal. Na semana passada, após o caso estourar, o jornal chegou a falar com o pai sequestrador pensando se tratar de um novo companheiro de Élida. Ele se apresentou como um empresário inocente. Afirmou ter adotado os dois filhos mais velhos e aparentou choque ao saber do histórico de crimes da mulher.
Caso Ida estivesse na Itália, não seria difícil trazê-la de volta ao Brasil. De acordo com o professor de direito familiar Gustavo Kloh, ambos os países são signatários da Convenção de Haia sobre sequestro infantil, e o caminho natural seria que um juiz italiano devolvesse a menina ao País. Aqui, seria julgado se a guarda definitiva ficaria a cargo da família brasileira ou dos pais traficantes, que estariam em desvantagem pela ficha criminal. O advogado do casal, Paolo Salandin, disse que as crianças e a mulher estão de férias em Santo Domingo e que esclarecerão as autoridades quando voltarem à Itália.
Fonte: Istoé